quinta-feira, 26 de julho de 2012

São Paulo – 2046 - 05/2007


O ano é 2046. Não, o mundo não acabou, como previam alguns ecologistas no começo do século. Ao contrário, nunca o planeta esteve tão limpo e desinfetado.
São Paulo, por incrível que pareça, tem um suave perfume de lavanda.
O grande problema de toda essa higiene é que ela acarretou um efeito colateral, que ninguém, nem os mais renomados sociólogos e psicanalistas, conseguiram prever. Mas os cientistas, em seu ímpeto de colocar nomes estranhos nas coisas, denominaram o quanto antes o mal: Chama-se Abstinência Poluitiva.
A abstinência poluitiva foi detectada primeiramente logo após a proibição das buzinas dos motoboys e nos carros das mulheres, e se agravou com a extinção do rodízio de carros e da erradicação dos flanelinhas e dos vendedores de filtros de água por telemarkenting.
Mal estar, enjôos e náuseas são os principais sintomas da enfermidade - Foram detectados, em casos menos freqüentes, depressão e histeria coletiva. Mas nesse caso, apenas quando o governo anunciava um novo aumento do salário mínimo.
Para reverter o quadro, ou pelo menos amenizar os sintomas, a prefeitura passou então a realizar, uma vez por ano, a Semana da Poluição Paulistana.
Semana da Poluição Paulistana consiste na recriação de situações de stress físico e psicológico, tão presentes na vida dos paulistanos décadas atrás. Os saudosistas adoram!
Durante o evento, a prefeitura mobiliza a Secretaria do Bem Estar Social para incentivar os motoristas a circularem por uma mesma avenida sempre em um horário específico. Então, ela fecha uma ou duas pistas da via, formando, assim, gigantescos congestionamentos, para o êxtase de motoristas e passageiros, que gritam de emoção - e desespero - dentro dos carros.
Além disso, enormes tendas são abertas por toda a cidade para a simulação de diversos tipos de poluição. Umas das mais procuradas é a requisitada Câmara de Gás. Apesar do nome, ela não tem nada a ver com as técnicas utilizadas pelos nazistas na Segunda Guerra Mundial.
Ao entrar na Câmara de Gás, o cidadão escolhe entre inúmeros tipos de odores que relembram a São Paulo dos velhos tempos: Rio Tietê, Rio Pinheiros, Fim de Feira, Caminhão de Lixo, Escapamento de Caminhão Desregulado, e o mais procurado, o poético Ônibus Lotado em uma tarde de verão.
Há a possibilidade também de apreciar outra tenda, apelidada de Laranja Mecânica. Esta tenda é um espaço onde o cidadão é exposto às mais variadas situações de aflição e constrangimento, tão freqüentes na vida dos paulistanos da “velha guarda”. Um telão transmite, em 3D, imagens de crianças de rua, malabaristas nos faróis, mendigos e todo o rol de pedintes, enquanto o som, em Doulb-Surround, estremece as paredes com as abordagens: “É um assalto!”, “Passa o carro, dona!”, e outras mensagens no imperativo. Angustiante, e um sucesso de visitação!
A prefeitura ainda conta com um espaço aberto chamado Camelódromoou, como é carinhosamente chamado, Calcutá é Aqui. São centenas de voluntariados que se aglomeram em uma rua pré-determinada, tornando o trânsitos pedestre por ela praticamente impossível. Em meio ao caos e ao desespero, os voluntários gritam a plenos pulmões “3 por 1 real! 3 por 1 real!”, “Olha a pilha! Olha a pilha!”, “Paçoca, paçoca, paçoca!“ e outras delicadas abordagens de venda ao transeunte. Impossível voltar para a casa de mãos vazias!
Ao fim de cada dia, é realizado um delicioso churrasco de lingüiça e carne gorda para todos os que quiserem matar a saudade, regada a muito chope e refresco artificial de goiaba. Mas, depois de um dia agitado desses, a maioria da população prefere ir para casa e preparar um saboroso clean barbecue - berinjela grelhada, abobrinha na brasa e muito suco de clorofila para acompanhar. Afinal, é melhor não abusar de tanta realidade...

Contra-mão - 04/2007
Me admira vocês
Que desde os quatorze já sabiam
O caminho a percorrer

E aos trinta e oito
Têm certeza de onde estarão

Minha certeza
É meu caminho de hoje
Amanhã ou depois, pode ser

Que estarei convicto
De estar trilhando
Meu caminho pela contra-mão

A Arte da Guerra – Passo a Passo­ - 02/2007



Criada pelos chineses por volta do ano 1000, e patenteada pelos japoneses 3 anos depois, a pólvora foi usada pela primeira vez como arma de fogo por um rei francês, quando tentava acender um rojão no Ano Novo.
Os americanos inventaram a bomba atômica, a internet e o estilingue, mas hoje isso tudo está à disposição dos inimigos dos Estados Unidos, à vista ou parcelado no cartão.
No livro A Arte da Guerra – Passo a Passo­, o historiador americano Maximilian Coxy examina a guerra de perto e alerta: Ela não cheira nada bem.


O livro “A Arte da Guerra”, de Sun Tzu, ainda continua influente em combates de guerra?
Maximilian Coxy - Hoje sabemos que a obra de Sun Tzu foi consultada por diversos militares ao longo da História. Os romanos leram e a traduziram para o latim. Napoleão pode ter lido também, mas provavelmente em uma versão pocket book, assim como os ingleses, mesmo que ambos não admitam isso. É provável que ainda hoje militares a consultem para a preparação de combates. Mas isso é difícil responder com certeza, já que ainda estou na página 11 do livro.

Quem os EUA devem temer: a China, a Coréia do Norte ou a Al Qaeda?
Coxy - Possivelmente uma combinação entre eles. Os Estados Unidos devem se preocupar com a China e a Coréia do Norte juntos, ou a Al Qaeda com a China, a Coréia do Norte com a Al Qaeda. Ou uma união entre os árabes e algum país latino americano. Ou ainda uma junção dos todos eles. Enfim, hoje os Estados Unidos devem temer qualquer coisa que se mova, basicamente.

E a China pode se tornar uma superpotência sem guerra?
Coxy -Historicamente não conheço nenhum país que tenha alcançado status de superpotência sem guerra. Alguns países entraram em superguerras, mas sem nenhuma potência. Esses se deram muito mal.
A verdade é que, normalmente, a potências já estabelecidas não dão espaço para que uma nova potência surja. E esse é o prelúdio de um confronto bélico. Analisando a situação dos Estados Unidos e da China hoje, podemos garantir que a melhor decisão a ser tomada é comprar um pacote turístico para as Bahamas e ficar por lá por tempo indeterminado.

Qual é o maior problema da China em questões armamentistas?
Coxy - O grande obstáculo da China, apesar de seu investimento por estruturação bélica e seu número gigantesco de soldados alistados, é o setor de comunicação. O problema é que a língua chinesa é tão difícil que nem os próprios chineses conseguem entender muito bem. Isso atrapalha um pouco as decisões em combate. Um exemplo clássico disso foi a conhecida batalha de Yun-Pé, em 1667. Um enorme batalhão chinês estava alinhado, aguardando ordens para invadir a região de Yun-Pé, na fronteira com o Vietnã. O coronel Wing Li então ordenou a todos que seguissem em direção nordeste, mas os soldados não entenderam o que o coronel tinha dito e rumaram para oeste, chegando a Paris 8 meses depois.

Dos militares citados em seu livro, quem é seu preferido?
Coxy - Tenho verdadeira admiração pelo Duque de Ashmor. No livro, conto um de seus primeiros combates, na Índia, em 1703. É inspirador relatar como ele enfrentou e venceu o exército Mongol. Os Mongóis tinham 4.500 homens bem treinados e fortemente armados, enquanto o batalhão de Ashmor possuía apenas 120 soldados, que usavam chinelos para se defender e palitos de dente para atacar. E um estudo revelou que a maioria deles estava completamente bêbada na hora do combate. Foi um feito impressionante.

Muito obrigado, Sr. Coxy.
Arquimedes, o taxista filósofo - 02/2007

Em alguns países, principalmente os desenvolvidos, pessoas comuns, como os taxistas, conseguem se transformar em grandes filósofos. Aqui no Brasil, ao contrário, filósofos se tornam grandes taxistas.
Essa é a história de Arquimedes, o taxista filósofo.
Não vem ao caso explicar como ocorreu sua transformação de pensador a condutor. Crises, planos econômicos, juros altos, salários baixos... e quando foi ver, Arquimedes já estava dentro de um Gol branco, andando pelas ruas da cidade com a bandeira 2 ligada.
Apesar de estar rodando com seu táxi, ele aproveita os momentos que tem para refletir. Afinal, é um taxista em busca de respostas, nem que elas apareçam a caminho do Largo da Batata.
Mas não é somente dentro do carro que ele exercita seus conhecimentos acadêmicos. Quando está a pé, andando pelas ruas do bairro onde mora, costuma citar, por onde passa, trechos e pensamentos de grandes mestres da Sabedoria – Platão, Shoppenhauer, Nietzche. Na padaria mesmo, sempre que aparece por lá, seus colegas sempre ouvem atentamente suas sábias palavras, principalmente os que não estão escondidos debaixo do balcão ou atrás da porta.
Contudo, é ao volante que o condutor se sente mais confortável para suas confabulações e livre para as reflexões sobre temas que sempre inquietaram a humanidade... Quem somos? Para onde vamos? E quantas cuecas é bom levar?
São muitas as perguntas, e para a maioria delas ele ainda não chegou a uma conclusão definitiva. Mas de uma coisa tem certeza: O tempo e espaço são relativos, mas chegar atrasado no cinema é sempre um saco.
Algumas coisas atrapalham as confabulações automotivas de Arquimedes, como ambulâncias com a sirene ligada, buracos na pista e os temidos vendedores de pamonha. E clientes puxadores de papo, claro. Lá está ele, refletindo sobre o significado existencial do patinete motorizado, quando, do banco de trás, ouve:

-          E então, quem você acha que é o vilão da novela?

Com uma pergunta dessas, Sócrates pararia o carro e beberia duas doses de cicuta. Mas ele não é Sócrates, e como bom taxista, respondeu cortesmente:

-          Estou entre o mordomo e o jardineiro, chefe... 

É como ele sempre diz: “Melhor um cliente na mão do que duas epifanias voando...”

A verdade é que, após tanto tempo pelas ruas da cidade, Arquimedes já se acostumou com o caos e com a desordem da cidade, e nem se preocupa mais com os acidentes intelectuais de percurso.
Ontem mesmo, entre um farol e outro da Radial Leste, Arquimedes começou a refletir sobre sua vã existência. O surgimento do Universo, a efemeridade da vida... Estava progredindo bem, até um motoboy passar buzinando em sua orelha esquerda e fazer o filo-taxista perder a concentração. Então, o passageiro do táxi fez um comentário sobre a mãe do motoboy, e Arquimedes respondeu que São Paulo era assim mesmo e tal... Depois disso, não conseguiu mais voltar à sua linha de raciocínio, e sua vã existência ficará mais vã do que nunca.
Mas pelo menos voltou para casa feliz: Conseguiu descolar 5 mangos de gorjeta do cliente. Taxista educado é outro papo. 
Poeminha do Imigrante - 02/2007

Êta lasquera
Terra da fumaça e da garoa
Ô terrinha boa
Apesar da trabalhera

Olha só essa gentidão
Que não pára sossegada
Parece sempre atrasada
Correndo a cada tempo
Em uma direção

Não dianta ficar parado
Nem tampouco de braços cruzados
É melhor apertar o passo
Que aqui se vai para frente
Nem que seja carregado

Mas, apesar da confusão
Que deixa qualquer um abestalhado
Você parece homem apaixonado:
Aceitou comigo o casamento
Antes mesmo de lhe pedir a mão

Por isso, te digo agora cortesmente:
São Paulo, teu coração
É igual ao de mainha
É só dar uma apertadinha
Que sempre cabe mais gente! 
Poema da separação - 11/2006


Secou as lágrimas, o rosto inchado
Me olhou, com desprezo, e sussurrou
Vá embora, não quero mais você
Ao meu lado
E então, saí por aí, sozinho,
Fumei, bebi,
E procurei pela noite, em vão
Por algum caminho
Agora, enquanto você calcula juros
Debaixo de um ar-condicionado
Eu estou aqui,
Com meus jeans surrados
Meus cabelos compridos
Caminhando pela chuva,
Com um sorriso nos lábios
Posso mesmo não ser um modelo de pessoa
Desses que você encontra
Nas novelas e nas revistas importadas
Mas acredite, não estou à toa
Sigo em frente nesta vida
Uma hora ali, outra em outro lado
Mas sempre em frente
Calmo e vacinado
E se um dia, por acaso
Na rua você cruzar comigo
E eu estiver correndo
Contra o atraso, de terno e gravata
Com as sobrancelhas franzidas
Calando poetas
E tropeçando em mendigos
Por favor, compre umas flores
Vista seu vestido mais discreto
E reze pela minha alma
Porque, neste dia, meu amor
Não tenha dúvidas,
Eu já terei morrido.
Olhos de mel - 09/2006

Nunca se esqueça
Que apesar destes dias de dureza
Que apesar destas noites sem estrelas
Haverá sempre a esperança
E a doçura em seus olhos de mel

Se sorri, e se chora agora
Tudo bem
Seus puros e tristes olhos de mel
Nasceram livres para trilhar caminhos
Que nem todos conseguem entender

Solidão, amor, pureza
Lágrimas, por que não?
Lágrimas não são sinal de fraqueza
São a união de sal e leveza
Como o encontro do mar com o amanhecer

Seja forte apenas
Não perca sua doçura, apenas seja forte
Para quando, por tortuosos vales descer
E encontrar a desilusão
Juntar forças, subir
E tornar a sorrir, então


(Para a menina dos olhos de mel)
Felicidade, paz e livros - 07/2006

O que faz um solitário nos dias livres? Distrai-se em sua própria companhia, ou lê.
Como já estou ficando cansado de mim, ando lendo bastante. Leio o jornal diariamente, leio as revistas, duas ou três, que aparecem em casa durante a semana, e livros. Leio livros consecutivamente. Tenho uma lista, que por sinal nunca diminui, dos livros que já estão à minha espera. E, se o cansaço do trabalho, às vezes, me impede de ler o quanto queria nos dias da semana, aos sábados tiro o atraso. Aliás, já está virando hábito. Acordo sábado pela manhã, coloco um ou dois livros na minha mochila junto a uma garrafa com algo para beber, prendo-a no bagageiro da bicicleta e pedalo até o Ibirapuera. Lá, paro na minha árvore de leitura (chamo de árvore de leitura porque ela parece ter sido arquitetada para isso, com uma espécie de concha natural onde é ótimo para se acomodar, e uma enorme sombra em meio ao gramado do parque) e fico lendo por uma, duas, algumas vezes até três horas. E então, quando a vista começa a cansar, fecho o livro e dou uma olhada ao meu redor, pais e filhos brincando no gramado, amigos jogando bola, as velhinhas andando rápido com suas roupas de ginástica, enquanto seus maridos estão, provavelmente, assistindo televisão em casa. O sol e a natureza do parque me alegram o dia e me enchem de paz e, depois de ficar um tempo curtindo o sol e o mato e o silêncio, pego minhas coisas, junto tudo novamente e volto para casa. Chegando lá, preparo alguma coisa para almoçar e, na mesa, enquanto como, penso em como nós procuramos a felicidade em tantos lugares e procuramos em tantas pessoas e, curiosamente, às vezes encontramos a felicidade nos aguardando, serenamente, debaixo da sombra de uma árvore.

A lenda do grande mestre Ni.

A lenda diz que, em meados do século VIII, um monge, conhecido apenas por monge Ni, saiu em busca da iluminação, abandonando todos seus bens materiais e indo morar em uma caverna isolada, no alto de uma linda colina, depois de uma ordem de despejo da sua casa. Ali, ele tinha certeza que o caminho ao nirvana seria mais fácil, já que nenhuma testemunha de Jeová o acordaria domingo de manhã para vender revistas.
Na caverna, alimentava-se de frutos silvestres, meditava e, quando se sentia entediado, fazia palavras cruzadas e jogada peteca.
Após anos em total isolamento, um jovem apareceu em seu abrigo, dizendo ser vendedor de enciclopédias. Estava desesperado e com fome, e então, o grande monge ofereceu a ele abrigo e uma lata de atum. O rapaz sentiu-se agraciado, e mesmo não conseguindo comer o atum por não ter um abridor de latas, ficou encantado com a bondade daquele homem que, a partir daquele momento, virara seu grande mestre.
O monge aceitou com honra tal responsabilidade, batizando o rapaz de ishmira batsum, ou, em uma tradução literal, o discípulo que rói as unhas dos pés.
Assim, os dois passaram vários anos na montanha, o mestre e seu discípulo, um se elevando, outro aprendendo. Dividiam tudo o que tinham para a sobrevivência na clausura, a comida, a água, as vestimentas, só não dividiam o mesmo colchão porque pegava mal.
Um belo dia, enquanto meditava, monge Ni sentiu algo estranho em seu corpo, leveza, contemplação e uma vontade incontrolável de imitar uma galinha: sim, era seu corpo se elevando em direção à mais completa iluminação. O monge, então, levantou-se e, antes de alcançar o nirvana, declamou mais de 200 provérbios seguidos enquanto fazia polichinelos. Boa parte desses sagrados provérbios foi, infelizmente, perdida, porque o telefone tocou na mesma hora e o discípulo foi atender, e quando voltou o grande mestre já tinha terminado. O jovem então pediu para ele repetir o que tinha dito, mas o monge já não se lembrava mais.
O que nos restou, portanto, foi apenas uma faísca da sabedoria do grande mestre Ni, anotada por seu fiel discípulo em alguns post-its, antes de o monge alcançar a iluminação e partir dessa para melhor.
Abaixo, alguns dos sagrados provérbios de mestre Ni, anotados por ishmira batsum há mais de 13 séculos, e que ainda hoje são amplamente conhecidos nos países orientais:

O tolo admira a banana. O sábio a come.
Em uma sala com um menino e um velho, certamente um dos dois irá ao chão.
Na hora do apuro, um cálice e um penico têm a mesma serventia.
O tolo conta as estrelas. O sábio o espera terminar.
O sábio difere perfeitamente o ter e o ser. O fanho nem tanto.
Madrugada em São Paulo - 07/2006

Em boa companhia
Verde esmeralda
Do painel do meu velho carro
Saio por aí, e pelo asfalto vejo
Os holofotes dos imensos arcos do Chá
Transformando o chumbo, cinza e escuro,
Em ouro bruto
E em ouro,
Também se banham
Os Arcos do Jânio,
O Municipal e a Velha Sé
Vejo a dança luminosa, silenciosa e solitária
Dos faróis da Paulista
O reflexo milionário
Das muralhas multinacionais
Refletindo no Pinheiros, triste e belo
O compasso simétrico de luzes
Que cortam a 23
Os neons multicoloridos e multiconvidativos
Dos inferninhos da Augusta...

Definitivamente:
Há poucas coisas mais poéticas
Que as luzes de São Paulo na madrugada.
Old News! - 04/2006


BBC
BBC Londres - Pesquisadores da universidade de Harvard anunciaram importantes avanços no estudo sobre os benefícios da meditação. A pesquisa, realizada com dois grupos de roedores, foi um sucesso no meio científico.
No primeiro grupo, os ratos, após o término de oito horas em estado meditativo profundo, despertaram, fizeram uma roda, ensaiando alguns passos de capoeira. Depois, alguns dos roedores iniciaram uma coreografia do musical Hair, enquanto os outros acompanhavam a música com bandolins. Por fim, todos se confraternizaram, beijando-se e abraçando-se mutuamente.
Ao contrário do primeiro grupo, os ratos que não foram submetidos à meditação ficaram em um canto da gaiola, com a barba por fazer, discutindo política e falando mal das esposas.
O trabalho seria apresentado na próxima edição da revista “Science”, mas não foi possível, já que não houve comprovação da experiência devido ao fotógrafo da equipe, que estava ocupado na hora dos testes, tentando parar o soluço.
Os pesquisadores continuarão os testes, analisando agora os efeitos da meditação em kiwis.

Reuters
WASHINGTON (Reuters) - O presidente norte-americano, George W. Bush, anunciou nesta sexta-feira a possível invasão militar em mais um país árabe. O anúncio ocorreu após o presidente ficar sem sucrilhos em seu café da manhã. Em nota divulgada a ONU, George W. Bush afirmou que ficar sem sucrilhos, além de deixá-lo muito zangado e com vontade de chorar, é considerado ato terrorista, já que vai contra a liberdade, a moral e os valores americanos.
Após a informação, o preço do barril de petróleo bateu novo recorde, só chegando a um índice de normalidade no final do dia, com a divulgação de uma nota oficial de Washington que confirma o abastecimento de sucrilhos na dispensa presidencial, inclusive com sucrilhos de chocolate, o favorito do presidente americano.



Algumas verdades sobre os milagres de Jesus - 04/2006


Sobre a multiplicação dos pães:
“...Então Jesus tomou os cinco pães, deu graças e mandou-os distribuir à multidão. E todos comeram o quanto quiseram.”
Um mês depois, o Sindicato dos Padeiros entrou com uma ação na justiça, alegando concorrência desleal. Afinal, eles tinham material, salários, impostos e tudo mais para pagar, enquanto Jesus nem padeiro era. O processo terminou em uma audiência, quando ambas as partes chegaram a um acordo: eles abaixariam o preço dos pães se Jesus parasse de multiplicá-los.

Sobre a cura da cegueira:
“Perto da cidade de Jericó, um cego pede-lhe esmola. Jesus diz-lhe "vê" e o cego curou-se”
Um peregrino de nome Jacó, impressionado com o feito, procurou saber mais sobre tal cura. Por causa do peregrino Jacó, hoje o Mutirão da Catarata é um sucesso.

Sobre andar sobre a água.
“Tendo, pois, remado uns vinte e cinco ou trinta estádios, os discípulos viram a Jesus andando sobre o mar e aproximando-se do barco; e ficaram atemorizados.”
Exceto um, de espírito empreendedor, que logo abriu um parque aquático. O parque, conhecido como “Walk’n Water”, fechou dois meses depois, após o afogamento dos cem primeiros visitantes.

Sobre a multiplicação de pães e peixes:
“E tomando os cinco pães e os dois peixes, e erguendo os olhos ao céu, Jesus os abençoou; partiu os pães e os entregava a seus discípulos para lhos servirem; também repartiu os dois peixes por todos. E todos comeram e se fartaram.”
Vendo o milagre, um discípulo discretamente perguntou a Jesus se ele conseguia também multiplicar moedas de prata. Jesus, serenamente, explicou que o negócio dele era com pão e peixe, mas que conhecia um ótimo investimento em fundos de pensão, e prontamente forneceu o telefone de sua agência em Jerusalém.

Sobre a cura da paralisia:
“Nisso vieram alguns a trazer-lhe um paralítico, carregado por quatro; a ti te digo.... levanta-te, toma o teu leito, e vai para tua casa.Então ele se levantou e, tomando logo o leito, saiu à vista de todos; de modo que todos pasmavam e glorificavam a Deus, dizendo: Nunca vimos coisa semelhante.”
Observando aquilo, o mesmo apóstolo de espírito empreendedor abriu uma clínica especializada. O negócio começou a ir mal das pernas, já que ninguém saia dali andando. Para evitar outra falência, a clínica passou a oferecer Shiatsu e Quick-massage, o que salvou o negócio.

Quintana Revisitado - 07/2007



Todos esses que aí estão
Atravancando meu salário,
Eles passarão
Eu, passaralho!
 
Agradeço - 03/2006

Estava em Peruíbe, sábado, quando senti algo novo no meu universo de sensações. Eram quase seis da tarde e estava na água, no rasinho, vendo meu pai e minha sobrinha de cinco anos brincando e rindo. O tempo estava um pouco nublado, mas só um pouco, a luz do sol estava camuflada por entre as nuvens. Meu irmão e minha cunhada, na areia, conversando e sorrindo. E então olhei para os lados, e vi o mar, calmo e morno naquele fim de tarde de verão. Ao lado estava a linda montanha de Peruíbe, tão misteriosa e tão imponente...
Comecei a observar tudo ao meu redor, quieto, ouvindo só o barulho das ondas... meu pai, minha sobrinha, meu irmão e minha cunhada, o mar, os pássaros no céu, a montanha, a brisa do mar... foi então que me emocionei... Me emocionei por gratidão. Uma gratidão tão verdadeira e profunda pela minha vida, pelo barulho do mar, pela areia da praia, pelo ar que respirava... Quão gloriosa é a vida, quão glorioso é viver, é fazer parte de algo infinitamente complexo e belo. Agradeço por ser mais um grão de areia na imensidão do mundo, por ser parte desta perfeição, agradeço não por ser mais importante que aquela gaivota que voava na praia, agradeço por ser igual a ela, por ser igual à onda do mar, igual à montanha de Peruíbe...
Agradeço por existir. Agradeço por simplesmente ser.



Ele - 02/2006


Sete dias se passaram, e então tudo estava pronto. E aí Ele foi inventar de criar algo diferente com o montinho de argila que havia sobrado, e assim surgiu o homem. Dizem que Ele já foi pego resmungando baixinho “maldito montinho...”, mas ele nega de pé junto.O fato é que, desde sua última invenção, não tem mais sossego. Começou bem com os egípcios, e ficava até um pouco exaltado quando contava sobre os fenícios. Com os gregos então, ninguém O agüentava. Mas aí apareceram os romanos. Ai... aí a coisa começou a desandar.Aquela história dos dois bebês mamando em uma loba O deixou intrigado, apesar de ter achado um tanto anti-higiênico. Bem, o fato é que os bebês cresceram e acharam que a toca da mamãe já não era grande o suficiente para eles, e então tomaram conta de toda a Europa e a pontinha da África. Ele ficou admirado com a grandiosidade daquele pessoal. No entanto, aquela brincadeirinha com leões que eles adoravam O deixou puto, e então resolveu enviar Seu filho para colocar as coisas no lugar. Ele discorda, mas o comentário que se ouve por aí é que pelo jeito não deu muito certo. Até que um dia os Bárbaros souberam que quem tem boca vai a Roma e resolveram ir, e aí não sobrou loba para contar história.O tempo foi passando. Surgiram os franceses, e Ele adorou algumas invenções daquele pessoal, como o croissant e o patê de galinha, outros Ele ainda não conseguiu entender muito bem, como o bidê, a gravata e, em especial, a guilhotina, que enfiou de forma não muito sutil os conceitos de Liberdade, Igualdade e Fraternidade na cabeça do povo. Logo depois, apareceram os ingleses, que, ao contrário dos franceses, nunca conseguiram ao menos fritar um ovo sem que este virasse omelete. Em compensação, foi da cabeça daquele povo que saiu uma das mais importantes invenções de todos os tempos, a máquina, que não era nem tão gostosa como o patê, nem exótica como a gravata borboleta, mas que de uma coisa Ele não tinha dúvida: depois das máquinas, nada permaneceu como antes. Aliás, depois das máquinas, Ele, que sempre dormiu ao menos 10 horas por dia, passou a dormir no máximo 8. O tempo então começou a andar mais rápido, já que não era mais preciso o Sol para se ter luz. Justamente o Sol, que dera a Ele tanto trabalho. O tempo passou, e duas grandes guerras surgiram, e se não fosse Ele para dar uma mãozinha, tudo já teria ido pelos ares.Mas então, quando Ele já imaginava ter um pouco de sossego depois dos dois sustos seguidos, apareceram os norte-americanos. Logo Ele percebeu que moda não era o forte daquele pessoal, devido aos seus conjuntinhos de moletom cor-de-rosa. Contudo, adoravam construir coisas. Coisas grandes. E que queriam ser os maiorais, ser tão grandes quanto suas invenções. Criaram, assim como os franceses, algumas coisas exóticas, como as garrafas de refrigerante de 3 litros, o chiclete de melancia e o patinete (e Ele que sempre achou o rinoceronte esquisito). Criaram coisas interessantes também, como a torta de maçã, o basquetebol e o computador. Por falar em computador, Ele realmente não consegue entender como “esse troço” funciona. Na verdade, Ele sempre teve uns probleminhas com botões. Ir ao caixa eletrônico com Ele era uma desgraça. Mas com o computador a coisa piorou de vez. Ele até fez umas aulinhas particulares, mas depois de uma aula de planilhas no Excel, chegou a duvidar de sua Divina Sabedoria. E a coisa piorou com a chegada da internet. Toda vez que explicavam a Ele o funcionamento do e-mail, que se podia enviar uma carta em Cuba que chegaria na China no mesmo instante, Ele perguntava, perplexo - “Mas e o fuso-horário, heim? E o fuso-horário??”Ficou tão estressado com tudo isso que, depois de muito tempo de serviço, juntou suas férias acumuladas e foi viajar.A última notícia que tivemos dEle é que foi visto em uma praia do litoral cearense, de bermuda e chinelo de dedo, com um lap-top na mão. Estava debaixo de um coqueiro, tentando exaustivamente baixar uma música pela internet. Mas até aquele momento, ao que parece, sem sucesso.