quinta-feira, 26 de julho de 2012

Arquimedes, o taxista filósofo - 02/2007

Em alguns países, principalmente os desenvolvidos, pessoas comuns, como os taxistas, conseguem se transformar em grandes filósofos. Aqui no Brasil, ao contrário, filósofos se tornam grandes taxistas.
Essa é a história de Arquimedes, o taxista filósofo.
Não vem ao caso explicar como ocorreu sua transformação de pensador a condutor. Crises, planos econômicos, juros altos, salários baixos... e quando foi ver, Arquimedes já estava dentro de um Gol branco, andando pelas ruas da cidade com a bandeira 2 ligada.
Apesar de estar rodando com seu táxi, ele aproveita os momentos que tem para refletir. Afinal, é um taxista em busca de respostas, nem que elas apareçam a caminho do Largo da Batata.
Mas não é somente dentro do carro que ele exercita seus conhecimentos acadêmicos. Quando está a pé, andando pelas ruas do bairro onde mora, costuma citar, por onde passa, trechos e pensamentos de grandes mestres da Sabedoria – Platão, Shoppenhauer, Nietzche. Na padaria mesmo, sempre que aparece por lá, seus colegas sempre ouvem atentamente suas sábias palavras, principalmente os que não estão escondidos debaixo do balcão ou atrás da porta.
Contudo, é ao volante que o condutor se sente mais confortável para suas confabulações e livre para as reflexões sobre temas que sempre inquietaram a humanidade... Quem somos? Para onde vamos? E quantas cuecas é bom levar?
São muitas as perguntas, e para a maioria delas ele ainda não chegou a uma conclusão definitiva. Mas de uma coisa tem certeza: O tempo e espaço são relativos, mas chegar atrasado no cinema é sempre um saco.
Algumas coisas atrapalham as confabulações automotivas de Arquimedes, como ambulâncias com a sirene ligada, buracos na pista e os temidos vendedores de pamonha. E clientes puxadores de papo, claro. Lá está ele, refletindo sobre o significado existencial do patinete motorizado, quando, do banco de trás, ouve:

-          E então, quem você acha que é o vilão da novela?

Com uma pergunta dessas, Sócrates pararia o carro e beberia duas doses de cicuta. Mas ele não é Sócrates, e como bom taxista, respondeu cortesmente:

-          Estou entre o mordomo e o jardineiro, chefe... 

É como ele sempre diz: “Melhor um cliente na mão do que duas epifanias voando...”

A verdade é que, após tanto tempo pelas ruas da cidade, Arquimedes já se acostumou com o caos e com a desordem da cidade, e nem se preocupa mais com os acidentes intelectuais de percurso.
Ontem mesmo, entre um farol e outro da Radial Leste, Arquimedes começou a refletir sobre sua vã existência. O surgimento do Universo, a efemeridade da vida... Estava progredindo bem, até um motoboy passar buzinando em sua orelha esquerda e fazer o filo-taxista perder a concentração. Então, o passageiro do táxi fez um comentário sobre a mãe do motoboy, e Arquimedes respondeu que São Paulo era assim mesmo e tal... Depois disso, não conseguiu mais voltar à sua linha de raciocínio, e sua vã existência ficará mais vã do que nunca.
Mas pelo menos voltou para casa feliz: Conseguiu descolar 5 mangos de gorjeta do cliente. Taxista educado é outro papo. 

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